22 março 2016

Processo formativo do jovem jogador de futebol (escalões de base)

Muito se tem discutido sobre a temática da formação de jovens jogadores, o que se deve fazer, o que não se deve fazer, como se deve fazer, como não se deve fazer, os princípios que devem reger o processo e essencialmente a dicotomia entre ensino e ganhar.
A beleza do futebol é que este não é uma ciência exacta, o mesmo processo conduzido por pessoas diferentes, pela mesma pessoa num grupo diferente ou numa idade diferente, ou mesmo num contexto cultural diferente, raramente, ou diria mesmo nunca, leva ao mesmo resultado.
Por isso tudo o que se estuda e se afirma no futebol pode ser ou não uma verdade que leva a atingir os resultados pretendidos. O importante será que cada formador tenha o máximo de informação relevante acerca do assunto e confronte as opiniões (e volto a afirmar que são apenas opiniões e não verdades absolutas) com a sua experiência e adeqúe a sua maneira de trabalhar ao que acha correto.
O processo formativo do jovem jogador de futebol torna-se assim um processo nem sempre linear com bastantes variáveis, umas manipuláveis, tais como o modelo formativo do próprio clube, o espaço de treino e o processo de treino, outras menos manipuláveis, tais como a personalidade do jogador, a personalidade do treinador, o grupo de treino e o ambiente competitivo onde se encontram inseridos.

O que é a formação?

Eu definiria a formação como o processo evolutivo do jovem jogador, no qual devem ser transmitidas as bases do futebol e potenciado o jogador, tanto em contexto de treino, como em contexto competitivo (e aqui coloco um grande ênfase, o contexto competitivo é fundamental para um melhor e mais rápido desenvolvimento do jovem atleta).

Trabalho das características pretendidas:
Isto vai sempre depender das directivas do clube, ou, caso isso não aconteça, das ideias próprias do treinador. Mas no fundo será sempre potenciar as características já presentes no jogador e direccioná-las para uma evolução sustentada.

Competição:
Ponto fundamental na formação de qualquer jogador, seja ele bastante competitivo ou menos competitivo. É neste ambiente, de competição, que o jogador terá estímulos diferentes do treino, irá competir contra jogadores diferentes, com características diferentes das que está habituado em treino, terá de criar estratégias diferentes para ultrapassar os “problemas” que lhe são apresentados, sentirá o que é a competição, sentirá que já há público a assistir e a apoiar por uma ou outra equipa, sentirá pressão.

Será que há dicotomia entre ensinar e ganhar?

Ensinar:
Claramente formar jovens atletas deverá ser ensinar. Mas será que isso só é suficiente? Vejo inúmeros exemplos de treinadores que defendem que se deve ensinar primeiro a conduzir uma bola, fazer um passe, etc, sem oposição. Qual a motivação dos jovens jogadores nesse tipo de exercício? É isso que se vai ter em jogo? E estão a conduzir a bola com que objectivo? Não será mais benéfico fazê-lo com um opositor? Fazendo com que tenha de estar mais concentrado para executar o gesto técnico da melhor forma, mais rápido e sob pressão para não a perder, criando desde logo uma vontade de fazer cada vez melhor e uma competitividade em querer ser o melhor.

Ganhar:
Apenas treinar e jogar para ganhar também, a meu ver, não se torna produtivo. É estar-se a queimar várias etapas da formação do jovem jogador. É muito provavelmente estar a deixar de fora os menos competitivos apenas na procura do resultado. É formatar os jovens jogadores para o resultado, sendo que muitas vezes os estarão a condicionar a no futuro ficarem frustrados se não ganharem, deixarem de gostar do jogo e desistirem.

O ideal torna-se assim um meio termo entre as duas, a criação de uma mentalidade vencedora, tendo ao mesmo tempo a intenção do ensino do jogador, providenciando desde cedo intensidade no treino, competição e mentalidade de superação, de evolução.
Isto poderá ser facilmente atingido na criação de exercício lúdicos em que haja oposição, na realização de exercícios de técnica individual com oposição, na realização de exercícios onde haja competição (saudável e sempre com o objectivo de superação), na realização de (muito) jogo, formal, condicionado, reduzido, com objectivo de posse, com finalização, … essencialmente, o objectivo deverá passar por recriar ao máximo o que se passará na competição. Isso irá dar um estímulo maior ao jogador e fará com que esteja feliz e mais concentrado no treino.

Quais os princípios que acho fundamentais?

Para os escalões de base, visto de uma perspectiva um bocado reducionista, eu defendo que se deve basear o ensino/aprendizagem em cinco factores:

Agressividade defensiva:
Defendo que deve ser potenciado desde que o jovem jogador entra para um clube, que quando não tem a bola, deve procurar recuperá-la o mais rápido possível. Deve ser agressivo na procura da bola, deve querer a bola mais do que os outros. Afinal, qualquer miúdo gosta é de ter a bola nos pés.

Agressividade ofensiva:
Da mesma forma, defendo que quando o jogador tem a bola em seu poder, principalmente no início da sua formação, deve procurar ser agressivo na procura da baliza, do golo. Afinal o golo é o êxtase do futebol. O jovem jogador deve procurar ser directo, vertical, querer decidir.

Iniciativa:
Vem no seguimento da agressividade ofensiva. O jogador deve querer assumir-se como peça do jogo, deve ter a necessidade de ter a bola, querer ir “para cima” do adversário, querer fintar com objectividade e desequilibrar o adversário. O futebol vive dos desequilíbrios criados e, nessa perspectiva, deve-se incentivar o jovem atleta a procura-los.

Reprodução da competição:
Como dito anteriormente neste artigo, todos os exercícios de treino devem tentar recriar a competição, ter objectivos competitivos, ter oposição, ter objectividade e apresentar estímulos de finalização. Isto irá criar um ambiente de superação, de motivação e de felicidade no treino.

Tomada de decisão:
A tomada de decisão deverá ser porventura o factor mais importante. Esta não poderá ser dirigida, no qual o treinador decide pelos jogadores o que têm de fazer, mas dar asas à criatividade destes. Após a tomada de decisão torna-se então fundamental o feedback ao jogador, não dizendo que deveria ter feito de outra forma, mas explicando as outras opções que este teria na altura e fazendo-o chegar à solução que poderá ser a mais apropriada.

Serginho

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