04 fevereiro 2017

Guardiola tornou-se mau treinador de um momento para o outro?


Este não é de modo algum um texto a criticar ou enaltecer Pep Guardiola, mas sim um texto que faça pensar em todo o background que os jogadores trazem da sua formação e nos seus principais responsáveis.


A verdade é que esta primeira época de Pep Guardiola no Manchester City não está a correr dentro das expectativas criadas, essencialmente pelos media. Mas será que a culpa será só de Pep?

Tenhamos em conta que o seu modelo já funcionou, e muito bem, tanto em Espanha como na Alemanha, em equipas que no entanto apresentam executantes de topo, digamos ainda, que bem superiores à média de jogadores que apresenta agora na sua equipa.
Podemos discutir ainda que as contratações por si pretendidas não foram possíveis de concretizar na sua totalidade.
Mas o que eu acho que faz toda a diferença mesmo é a diferença de mentalidades na formação dos jogadores, e neste aspecto, tanto em Espanha como na Alemanha, já se vem trabalhando bastante e bem numa mentalidade e modelo com várias semelhanças ao pretendido por Pep.

Na minha opinião a grande diferença é que nos outros projectos ele “apenas” teve de trabalhar a perfeição do seu modelo, no projecto actual ele tem de trabalhar desde a base a sua forma de jogar.

Este caso actual vem servir de introdução ao tema que se pretende discutir, a qualidade da formação dos jogadores.

Neste aspecto em Portugal, poucos são os clubes que apresentam já um modelo de formação, onde se pretende chegar, como chegar lá e o que se deve trabalhar para lá chegar, i.e., como se ensinar/trabalhar o jovem jogador para chegar a sénior com bases que permitam entender o jogo.

Deste modo observamos vários casos de jovens jogadores de futebol, que apesar de apresentarem bastante qualidade/habilidade, não apresentam o mínimo de condições de abraçar o futebol sénior por falta de bases ou por uma deficiente tomada de decisão.
Aqui temos de apontar culpados, que neste caso passam por clubes, treinadores e Pais dos jogadores.

Obviamente os clubes são culpados disto pois comprometem-se, a maior parte das vezes pedindo dinheiro, a dar formação desportiva aos jogadores mas no entanto não se preocupam com a qualidade desta.
Muitas vezes observamos treinadores sem formação nem conhecimentos a orientar treinos dos escalões de formação, não transmitindo as bases aos jovens praticantes nem potenciando as suas capacidades.
Mas também são culpados por, comprometendo-se a dar formação desportiva, não apresentarem um plano de desenvolvimento desportivo. Na escola existe um plano de estudos, porque não exigem os Pais aos clubes também um plano de formação de modo a saber como se pretende fazer a evolução desportiva dos seus filhos?
Por outro lado, ainda se torna mais culpado quando exige aos seus treinadores resultados competitivos (vitórias) esquecendo a formação desportiva dos seus jogadores, pedindo ganhar para projectar o clube em detrimento de formar para ganhar.

Quanto ao treinador, este também tem culpa neste processo. Desde já porque encontramos na formação vários treinadores que ambicionam ser treinadores de seniores, não adaptando os seus treinos às idades e necessidades dos jovens jogadores.
Vemos também o treinador que trabalhando na formação pretende valorizar-se através de vitórias em vez de valorizar os seus jogadores. Deste modo vemos muitas equipas nas quais apenas competem os mais fortes fisicamente e os mais hábeis com o objectivo de ganhar jogos, esquecendo-se os treinadores de trabalhar os princípios básicos do futebol (obviamente não é preciso ensinar a fazer uma cobertura defensiva se temos jogadores mais fortes nem é preciso ensinar a vir dar apoio ao portador da bola se podemos chutar a bola para a frente e pôr o jogador mais rápido a correr atrás dela, deve ser o pensamento destes treinadores).
E acima de tudo são responsáveis porque não pensam no processo, em que estádio de aprendizagem se encontram os seus jogadores, onde queremos que eles estejam daqui a uns tempos e o que fazer para se chegar lá. Como vou trabalhar e o que tenho de ensinar para conseguir atingir os objectivos a que me proponho deve ser a principal pergunta que se faz um treinador quando pega numa equipa de formação.
Para além disto, outro dos fenómenos frequente nos treinadores é o gritar ordens para dentro do campo, apresentando eles toda a tomada de decisão não dando liberdade aos jogadores para tomar as suas próprias decisões, castrando aqui todas as hipóteses de o jovem vir a apresentar tomada de decisão acertiva no seu futuro enquanto jogador e enquanto ser humano.

Por fim, e a meu ver os mais culpados desta falta de cultura desportiva são os Pais. Desde já porque só se interessam em ganhar jogos e em criar Ronaldos, quer seja pelo dinheiro que pensam poder vir a ganhar, quer seja para projectarem nos seus filhos as suas frustrações enquanto ex-projectos de jogadores.
A primeira preocupação do Pai deveria ser procurar um lugar com um modelo formativo, i.e., preocupar-se com o processo de formação desportiva e cívica do seu educando, tomando a decisão sobre qual o mais indicado.
Posto isto, a preocupação do Pai deverá ser a do processo de aprendizagem, quais os comportamentos a adquirir e se estes estão a ser adquiridos pelos seus filhos, em vez da normal associação que os pais fazem Ganhar jogos = evolução.
Outro dos aspectos prejudiciais à evolução do jovem jogador é a atitude dos Pais nos jogos, constantemente gritando instruções e criticando os intervenientes no jogo, não dando liberdade para o jogador decidir livremente e muitas vezes, pedindo o oposto ao pretendido pelo treinador.

Acima de tudo, os pontos que se devem reter são os seguintes:
- a formação desportiva é um momento de aprendizagem, e como tal, necessita ser faseada, sem falhar nenhuma etapa e ensinada por quem sabe dentro de um modelo;
- deve ser dada total confiança a quem está a ensinar os jogadores para liderar o processo sem intervenção externa;
- deve-se ter em conta que os ritmos de aprendizagem diferem de pessoa para pessoa, deste modo dar tempo para que se captem os conteúdos;
- não confundir ganhar jogos com evolução;
- incentivar a tomada de decisão do jogador, trabalhando-a nos treinos e corrigindo-a caso houvesse outra opção, não condicionando mas abrindo novas perspectivas na leitura de jogo;
- acima de tudo, dar relevância à evolução individual e colectiva e não aos resultados.

P.S. - Pep Guardiola continua a ser um dos melhores treinadores do mundo, a base formativa dos jogadores que agora tem na equipa é que é totalmente diferente!

Serginho

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